2023-04-19 | Festividades
Da história à festa.
As festas em honra da Nossa Senhora da Saúde são uma tradição religiosa que remonta ao século XVI, sendo igualmente um momento importante para os fiéis e para a comunidade local, que se reúnem para celebrar a fé e a devoção à Nossa Senhora da Saúde. É uma das mais importantes tradições religiosas da região, realizadas no lugar de Gueifães, freguesia de Cidade da Maia.
Enquadramento devocional
O culto a uma figura feminina faz-nos recuar até ao Paleolítico, concretamente às pequenas estatuetas designadas ‘vénus aurinhacenses’. É de salientar o culto das deusas-mães, não apenas pela abrangência cronológica e geográfica do seu culto, mas também pelo facto de algumas delas terem sido substituídas pela Virgem Maria.
No séc. V (431), o Primeiro Concílio de Éfeso proclama Maria como Teotokos (Mãe de Deus), dando carácter institucional ao culto mariano. Ao longo da Idade Média, o culto mariano expande-se através do aumento do número de festas, que passavam de Oriente para Ocidente.
No decorrer dos séculos XIX e XX, deu-se um reforço de culto à Virgem, associado a duas razões. Em primeiro lugar, pela transformação em dogma de festas, crenças e práticas religiosas relativas a Maria que já existiam desde a Idade Média. Em segundo, devido às aparições de Maria, que despertavam grande fervor entre os crentes, progressivamente reconhecidas pela Igreja, como foram os casos de La Salette (1846), de Lourdes (1858), ou de Pontmain (1871), como de Fátima (1917), de Beauranig (1932-1933), ou de Banneaux (1933).
Em relação ao culto mariano em Portugal, deve referir-se que, ainda antes da fundação do reino de Portugal, o culto a Maria pode ser notado, por um lado, pela substituição de cultos já existentes de deusas, como Ceres e Ísis. Por outro, logo que a cidade do Porto foi conquistada aos mouros, foi colocada sob a proteção de Nossa Senhora, sendo denominada “cidade da Virgem, Civitas Virginis”.
Nos primórdios da nacionalidade, a Virgem surge, desde logo, associada ao primeiro rei de Portugal. É conhecida a lenda segundo a qual a Virgem, invocada por Egas Moniz, teria realizado a cura milagrosa da deformação inata que o infante tinha nos membros inferiores ou das pernas “em colheitas”, como aparecem descritas na Crónica de 1419. Além deste episódio, a proximidade de D. Afonso Henriques com a Virgem, é particularmente acentuada, culminando em 1143, aquando da criação do Reino de Portugal, momento em que D. Afonso Henriques terá colocado o novo reino sob a proteção da Santa Maria de Alcobaça.
No século XX, o culto mariano magnetiza-se em torno de Fátima, não apenas pelas aparições da Virgem, que aliás estão presentes em outros lugares do território português, mas também devido a um conjunto de dinâmicas religiosas, sociais e políticas que se estendem até ao seu reconhecimento pela Igreja em 1930 e que se prolongaram ao longo do século XX.
Invocação à Virgem
Nesta dimensão do culto mariano, importa referir que, em Portugal, existem próximo de mil invocações da Virgem, sendo uma delas, a Senhora da Saúde.
A primeira referência que se encontra do culto à Senhora da Saúde em Portugal data de 1176, na Sé do Porto, sendo uma imagem “de grande veneração” e que permanece ainda numa capela do claustro da referida catedral. Todavia, é necessário esperar pelo século XVI para que o culto ganhe mais expressão, pelo menos mais documentada, quando, em 1569, a cidade de Lisboa foi atingida por uma peste que terá vindo de Veneza, e que chegou a matar mais de 500 pessoas por dia, foi pedido o auxílio da Virgem para fazer face a tão grande calamidade.
Em agradecimento pelo debelar da epidemia foi criada, em 1570, a procissão de Nossa Senhora da Saúde. Terá sido a partir desta invocação da Senhora da Saúde do Martim Moniz (Lisboa) que este culto, pelo menos numa fase inicial se terá expandido para outras regiões do território português.
Nossa Senhora da Saúde de Gueifães
Atualmente, o culto à Senhora da Saúde está presente em mais de 300 lugares. Um desses locais é a freguesia de Gueifães, que com o novo ordenamento do território (2013) passou a integrar a freguesia da Cidade da Maia.
As referências à Senhora da Saúde de Gueifães são exíguas, havendo apenas uma alusão a uma imagem da Senhora da Saúde nas Memórias Paroquiais de 1758, referentes ao distrito do Porto. Hoje existem 3 imagens, 2 na igreja antiga (uma pequena e uma maior) e 1 na igreja nova, sendo esta a que sai em procissão.
Em Gueifães, todos os anos, os crentes prestam um culto particular à Senhora da Saúde. Aqui, como em mais de 300 lugares em Portugal, é prestado um culto a esta invocação da Virgem, uma das quase mil, existentes em Portugal.
Como é habitual nas práticas religiosas populares, no dia da festa da entidade religiosa realiza-se uma procissão que faz percurso com regras definidas, seguindo uma direção e sentido definidos. Contudo o percurso pode alterar-se ao longo do tempo, decorrendo de diversas circunstâncias, como aconteceu na Senhora da Saúde em Gueifães.
O percurso inicial terá sido alterado por um homem, detentor de capital social, antigo emigrado na África do Sul, frequentador assíduo da igreja e descrito por aqueles que privaram mais de perto com ele, como “justo” e “ponderado”. Perante a doença da esposa, este homem pediu à Senhora da Saúde a sua cura, prometendo puxar a procissão até à porta de sua casa. A mulher ficou curada e a procissão, desde essa altura, passa à porta de sua casa. A partir daí, no dia da procissão, neste lugar, os autóctones passaram a desenvolver rituais de sacralização do espaço, nomeadamente através da construção de um altar e de tapetes de flores.
Festas em Honra de Nossa Senhora da Saúde 2023
Decorrem até ao dia 25 de abril! É uma festa que envolve toda a comunidade e conta com uma programação variada que inclui missas, procissões, concertos e fogo de artifício. Veja aqui o programa:
Fonte: “Paisagens religiosas efémeras, crenças religiosas perenes – o culto à Sr.ª da Saúde no Subidouro” – Maia – Pedro Ferreira
“Na Maia, sorria para a vida!”